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sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Ensino médio no Brasil, configuração de classes, pioneiro dos cursos profissionalizantes

O Desenho como Disciplina Importante para Indústria Baiana – Escola Média”profissionalizante”

Em Portugal, a partir da segunda metade do século XIX, apesar da fragilidade dos sistemas de ensino que se organizavam, o Desenho ganhou espaço significativo no quadro disciplinar dos liceus, mesmo que envolvido nas ciências exatas. No Brasil, as atenções se voltaram para o atendimento da demanda oriunda das classes menos abastadas, com foco na formação da mão-de-obra industrial e o discurso do governo da Bahia se voltou para a criação de escolas médias industriais. A disciplina de Desenho, entretanto, teve destaque incipiente. Vale lembrar que a segunda metade do século XIX foi marcada por acontecimentos que incentivaram a inserção do Desenho no setor educacional em nível mundial. Entre eles, a expansão industrial e as exposições internacionais, principalmente a de Londres, em 1851, que desencadearam a socialização do Desenho com a criação de escolas de Desenho em vários países da Europa, iniciadas na Inglaterra.
Enquanto as outras nações ocidentais corriam para inserir o ensino de Desenho nos seus espaços escolares, entre eles a França, a Inglaterra e até mesmo Portugal, o Brasil, especificamente a Bahia, partiu para ações voltadas à formação industrial apenas a partir da segunda metade do século XIX. Em 1851, os primeiros indícios aparecem demonstrando a necessidade de se incrementar o ensino profissionalizante para atender à indústria e ao comércio.
No plano de estruturação do ensino público nacional, os liceus e o Colégio Pedro II
estavam destinados à formação intelectual da elite e a formar o quadro administrativo da
nação. Na contramão dessa formação, começaram a surgir as Aulas Médias, que tinham o claro propósito de atender às classes menos abastadas, como já fazia o Colégio dos Órfãos, mas no sentido de formar a mão-de-obra técnica que deveria atuar na indústria. Essas aulas médias seriam criadas para atender “os jovens que pretendem antes dedicar- se á indústria, e ao commercio que as Sciências” (MADUREIRA, Relatório, 1851, p. 9). Essas escolas, que podem ser consideradas como sementes para cursos profissionalizantes, eram destinadas a despertar o gosto pelo trabalho e formar mãos de obra técnica.
A idéia de se adotar este tipo de aula média veio com inspiração no que se fazia na Prússia, cujo modelo também foi adotado na Holanda, e em 1833, na França. A escola da Prússia propunha o “ensino dos conhecimentos indispensáveis em indústria, e commercio ao jovem que não se destina a freqüentar as Universidades”. Na França, elas eram denominadas de “escolas de instrução primaria superior” que, na verdade, tinham a mesma finalidade das escolas médias da Alemanha, como afirma Madureira (Relatório, 1851, p. 10). Nessas escolas “além do que se ensina nas escolas elementares, elementos de Geometria e suas applicações usuaes”, se deveria ensinar, “especialmente, o desenho linear, e agrimensura, noções de Sciencias phisicas e de Historia natural applicadas aos usos da vida, Musica elementos de Historia e Geometria da paiz” (Idem). O Desenho Linear e a Agrimensura, portanto, tornavam-se saberes importantes para a formação do quadro técnico pretendido.
Casimiro de Sena Madureira (Relatório, 1851, p. 10), era Diretor de Instrução do governo de Gonçalves Martins, de forma incipiente, foi quem primeiro procurou alertar o poder público sobre a necessidade de se investir em estabelecimentos escolares que fornecessem uma formação voltada para a indústria, “a necessidade de escolas industriaes nos bate a porta”.
Para isso, salientou que até aquele momento “nada temos para isso disposto”. A socialização do saber em Desenho foi por ele estimulada ao mostrar que “as aulas de Desenho applicadas as artes, e de Mechanica applicada concorrem para o ensino, que devem ter os jovens, que se destinão a industria”, porém apenas esses dois modelos de instrução “não bastão para habilital-os” (Idem). A freqüência era muito baixa “Ellas tem sido apenas fraquentada por aprendises menores do Arsenal Guerra onde estão estabellecidas”, e por apenas “4 externos”. A aula de Desenho tinha “21 menores do arsenal, e a de Mechanica” tinha seis alunos. Segundo Madureira “o limitado numero de 4 alunos externos”, mostrava o estado acanhado do “espírito
público para a instrução mais necessária as classes menores abastadas, que tem de viver da industria, principalmente de Agricultura, que he fonte mais abundante da riquesa do Brasil” (MADUREIRA, Relatório, 1851, p. 10).
Dessa forma, Madureira assinala a criação das aulas de Desenho Aplicadas às Artes e a de Mecânica Aplicada como meio de estimular, incentivar e servir de exemplos para o surgimento de futuras escolas industriais. Assinala também que, para isso, essas aulas se mostravam necessárias para o preparo dos professores que poderiam atuar nas futuras aulas médias, essas destinadas a aspirantes à indústria e ao comércio.
As idéias já disseminadas por Casimiro Madureira foram alimentadas e estimuladas por João Mouricio Wanderley, então presidente da província da Bahia. Wanderley propõe também, como forma de suprir uma lacuna entre o ensino primário elementar e o ensino secundário, a adoção do mesmo modelo adotado na Prússia - a criação de Escolas Médias ou de Instrução Primária Superior.
Mais uma vez, o governo reforça o objetivo dessas escolas dedicadas aos “jovens que não tendo bastante fortuna, nem talentos para seguirem a litteratura ou as sciencias, possuem com tudo meios de tomar a nobre carreira da industria”, para que estes não ficassem limitados à instrução primária elementar, que se criassem, então, escolas médias (WANDERLEY, Fala, 1853, p. 28).
Este reforçou a inserção do saber em Desenho nos espaços escolares voltados para o ensino industrial, assim como na gestão de seu antecessor, Gonçalves Martins. O ensino do Desenho seria complementado com elementos de Geometria prática, fornecendo os primeiros dados das profissões industriais com a criação de Escolas Médias. Como justificativa, salienta também que “poderemos fazer um ensaio que nos habilite a fundar escolas industriais de que tanto carece a província” (WANDERLEY, Fala, 1853, p. 29).
O quadro de disciplinas dessas escolas deveria ser formado pelas já criadas para instrução primária. O Desenho Linear já fazia parte desse quadro, tanto no Liceu quanto na Escola Normal. Foram acrescentadas a esse quadro, segundo Wanderley (Idem) e Moacyr (1939, p. 91), Elementos de Geometria – “prática a qual fornece os primeiros dados da profissão”; Ciências Físicas e História Natural – “que nos familiarizam com os fenômenos da natureza”; Música – “que dão à alma uma verdadeira cultura interior”; Geografia – “que nos ensina facilitar a memória”. Os cursos médios deveriam ser criados na capital e nas duas províncias mais populosas como: Cachoeira e Santo Amaro.
Essas escolas criariam alternativas de atuação profissional para alunos dos cursos de
humanidades e da Escola Normal. O ensino do Desenho Linear, o Desenho de Ornato e o Desenho de Imitação faziam parte do curso profissionalizante que já existia no Colégio dos Órfãos de S. Joaquim, na Bahia, que visava garantir meios seguros de acesso ao mundo do trabalho profissional, pois se deveria possibilitar que os órfãos ao “sahirem do collegio teham meios seguros de se empregarem utilmente, e de adquirirem uma profissão na sociedade civil” (WANDERLEY, Fala, 1853, p. 22).
Em relação ao ensino elementar de Desenho, Albuquerque sugere a obra do francês “Francoeur que tem por titulo: Le Dessin linéaire d’aprés la methode de lénseignement mutuel; dédié à la Société d’instruction élémentaire. Paris, 1819”. Albuquerque considerou esta obra como “proprissima para guiar os professores de escola primaria nesta parte de ensino”, mas salienta que seria “necessário promover a sua tradução” (Idem).
Entretanto, até 1852, na Bahia, ainda se tem noticias de que a dificuldade para o ensino do Desenho na Escola Normal estava ainda na inexistência de “compêndio de Desenho Linear em língua nacional”, ficando o professor à mercê de uma apostila do compêndio de Francoeur, traduzindo-o no ato de explicar as lições. Essa situação retardava o processo ensino-aprendizagem, “por haverem alunos mui vagarosos em escreverem o que se lhes dita”, como destaca Casimiro de Sena Madureira, no Relatório enviado ao presidente da província Francisco Gonçalves Martins, nesse ano de 1852 (Moacyr, 1939, p. 93; Madureira, 1852, Relatório, p.13). Durante a pesquisa, encontrei um registro de entrada do Dessin linéaire em
Portugal, sob ofício do dia 18 de setembro, que traz indicação sobre a liberação do livro de Francoeur pela Mesa Censória49 portuguesa, mas só em 1860.
RELATÓRIO sobre o estado da instrução publica da província da Bahia, apresentado ao Exmo desembargador conselheiro Francisco Gonçalves Martins, presidente da mesma província, por Casimiro de Sena Madureira, diretor geral dos estudos, 1851

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